Foto 1 - Cisterna: lado nascente Foto 2 - cobertura com abertura de extração de água
Quem tem Água é Rei. Em Almada, a escassez desse bem essencial foi, durante séculos, fruto de grande preocupação. O povo abastecia-se diretamente na Fonte da Pipa (situada entre o Olho de Boi e o Ginjal) ou comprava a água na vila aos aguadeiros que a traziam dessa fonte, galgando a rocha em pesadas pipas atreladas a animais e carroças. Possuir um reservatório de água, como um poço ou uma cisterna, era riqueza só de alguns. Na Casa da Cerca, descendo por uma estreita escada em caracol que existe no corpo norte-poente do edifício, encontramos a Cisterna. É fácil imaginar este espaço subterrâneo, escuro e fresco, cheio de água como um aquário gigante. A sua planta circular e a cobertura em cúpula fazem com que um som, por mais fraco que seja, amplifique, ecoe e reverbere. Uma abertura liga a Cisterna ao vão das escadas da ala nascente. Era daí que se extraía a água, abastecia-se o bebedouro de animais existente no pátio, irrigavam-se as plantas e hidratavam-se as pessoas. É um dos espaços mais antigo da Casa da Cerca, provavelmente anterior ao núcleo arquitetónico do século XVI, o piso térreo da ala norte. Explorando a geometria da planta da casa, constatamos a sua proporção áurea: o retângulo de ouro que delimita a casa tem o polo da sua espiral, precisamente, na Cisterna. “A origem de todas as coisas está na Água”, dizia Tales de Mileto ( c.624 - 546 a.C.), um dos primeiros pensadores gregos. Terá sido aqui o ponto de origem de onde a Casa evoluiu ao longo do Tempo? Tendo a sua função original extinta, a Cisterna é, desde 1995, um dos espaços de fruição de Arte Contemporânea.
Sílvia Moreira
Esquema da planta da Casa da Cerca: o polo da espiral áurea situa-se na Cisterna. Desenho de Tiago Conceição (estagiário).